O objetivo na vida deve consistir em ser muito, e não ter muito

O desejo de superar os seus próprios limites fez com que o homem deixasse o solo da Terra para pisar na Lua, descobrisse que o nosso planeta não era o centro do Universo e iniciasse as suas grandes descobertas no campo da ciência. Amparando-se na grande promessa de progresso ilimitado, o ser humano não mediu esforços para revolucionar os diversos campos dos saberes.

Um grande marco deixado pelo homem foi o começo da era industrial. Iniciada no século XVIII, constituiu-se como um momento histórico em que a atividade produtiva artesanal passou a ser substituída pelo emprego das máquinas, sendo esse trabalho conhecido como maquinofatura. Desde então, o cenário mundial ganhou o tom consumista que hoje conhecemos.

Não precisaria ser um gênio para prever que uma estrada trilhada para a produção ilimitada, certamente nos levaria a um consumo sem limites, sendo o consumismo considerado atualmente uma grave doença comportamental que se alastra sem precedentes. Albert Schweitzer ao receber, em 1952, o Prêmio Nobel da Paz em Oslo alertou que o homem, ao aumentar os seus poderes, torna-se cada vez mais pobre e mais desumano. Enquanto a cobiça e o egoísmo guiarem o modo de viver do ser humano, maior será a distância entre ele e a genuína felicidade que visa alcançar.

O problema maior não é o consumo, até porque ele é, até certo ponto, necessário no cotidiano das pessoas. É perfeitamente aceitável o ser humano adquirir coisas a fim de desfrutá-las. A questão se torna preocupante quando o consumo vira uma compulsão, ao ponto de causar prejuízos financeiros e, inclusive, emocionais na vida do indivíduo.

Estudos no campo da neurociência comprovam que o cérebro movido pelo desejo de consumo libera certos neurotransmissores como a dopamina, adrenalina e serotonina que possibilitam uma sensação prazerosa ao organismo após obter a satisfação do seu desejo. A química que se processa no circuito cerebral reduz a ansiedade no ato do consumo. Em contrapartida, após algum tempo, a ansiedade retorna e solicita uma nova aquisição, instalando-se a dependência. A sociedade contemporânea virou uma espécie de consumidora de emoções, a sua meta está totalmente voltada para o desejo de experimentar novos estímulos e a ânsia de adquirir algo inédito.

O foco em si não está no objeto concreto que é alvo do consumo, mas no que ele representa, isto é, no status que confere. Não é a toa que tomando como exemplo a indústria da moda, existem roupas que são projetadas para uma determinada estação do ano e, passado este período, tornam-se facilmente descartáveis. A roupa continua nova, contudo para a próxima estação ela não possui mais o valor social almejado. Aqueles que insistirem em usá-las, correrão o risco de serem considerados “ultrapassados”. Assim como no âmbito da moda, esta visão se estende para os diversos outros meios de consumo.

Ao atribuir um valor ao objeto, o ser humano perde de vista o seu próprio valor. Cada pessoa é singular, a beleza existe em cada ser. Nessa busca desenfreada para incorporar o novo, o homem se afasta daquilo que ele já traz consigo – a sua essência. A ditadura do consumo firma padrões e impõe a sua força para transformar as pessoas em verdadeiras tropas, confinadas em caixas. O desrespeito à individualidade se torna evidente, extinguindo as capacidades criativas e supervalorizando uma cultura massificada. Ninguém precisa procurar fora de si o seu valor, pois ele vem de dentro. Não existe nenhum ser humano vazio, dentro de cada um existe um vasto mundo a espera de ser redescoberto e reinventado.

O consumismo coloca em evidência a necessidade de mudanças essenciais nos valores e atitudes humanas, tais como uma nova ética e uma nova postura para com a natureza. A mudança de estilo de vida e no padrão de consumo deve ser incentivada. Os cidadãos precisam decidir o que devem consumir, não sendo o papel das indústrias e dos meios de publicidade decidirem o que é melhor para a sociedade.

O governo, a indústria e as comunicações de massa querem convencer a todos que o consumismo oferece a porta para a felicidade absoluta e para a liberdade irrestrita. Mas se por meio do consumo o completo bem-estar defendido fosse alcançado, hoje não seria tão evidente na sociedade a presença de indivíduos deprimidos, infelizes, ansiosos, destrutivos e dependentes. Desse modo, constata-se que ter algo não oferece a garantia de uma felicidade plena. Apesar disso, muitos ainda acreditam que o seu valor pessoal é definido pelas suas posses.

Marx ensinava que o objetivo primordial na vida deve consistir em ser muito, e não ter muito. O que verdadeiramente importa na vida não é o quanto se consegue acumular, afinal os bens se desgastam com o passar do tempo e novos desejos a todo o momento surgem. A felicidade sincera não se resguarda, mas sempre se expande, envolvendo aquele que a irradia, bem como todos ao seu redor. A felicidade maior está em espalhar o bem, com o coração aberto, sem olhar a quem.

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Saulo de Oliva

Médico, especializado em Psiquiatria. Psicólogo.

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