RESSENTIMENTO

O perdão é só uma vez, o ressentimento não.
Para se manter o ressentimento é preciso acordar todos os dias lembrando o quão ressentido estou. O quanto o outro me fez sofrer. É preciso empregar uma quantidade de energia remoendo o que o outro me fez, lembrar-se da emoção, da sensação, dos sentimentos, dos pensamentos e combinar tudo isso.
Aprofundar a história que estou contando pra mim mesmo pra sustentar o ressentimento.
Dá muito trabalho, é um esforço diário, se não for horário.
Emprega-se muito tempo pensando sobre isso, falando disso, alimentando isso.
É necessário nutrir esse ressentimento, aumentá-lo, vivê-lo, com bastante frequência.
O perdão é só uma vez.
Perdoei, acabou. Não há nada a ser alimentado, estimulado, lembrado, repassado à exaustão.
O que é de fato perdoar?
É entender os motivos do outro e principalmente entender que o que eu senti, foi uma interpretação minha de ofensa.
Se eu me ressinto, é porque algo ou alguém não foram o que eu esperava. Alguma atitude do outro foi levada como um dano pessoal a mim.
O ressentimento e o perdão são assuntos de ofensa pessoal.
Se posso entender que não tenho controle sobre as atitudes do outro, sobre o pensar e agir do outro, entendo que nada que o outro faça pode dizer respeito a mim.
O que o outro faz é dele. É ele quem tem que lidar consigo mesmo.
Logo o ressentimento é algo meu, que eu criei e alimentei com relação ao outro.
Quando me livro do ressentimento entendendo que ele é o meu esforço para criá-lo e mantê-lo, automaticamente, perdoo.
Acaba.
Temos pouca ou nenhuma energia porque passamos grande parte do tempo alimentando nossas criações emocionais. É um esforço constante manter as emoções ativas dia após dia. Não sobra nada ou quase nada de energia.
Energia essa que poderia estar sendo usada para uma investigação séria sobre nós mesmos. Investigar sobre nós mesmos é investigar sobre a humanidade, a vida e a criação.
Existe assunto mais importante e urgente do que esse?
Deneli Rodriguez.
24.05.2019.


Deneli Rodriguez

Pensadora, escritora e artista. Menção honrosa Itaú Cultural com seu texto "A Menina Iluminada". Concorrente aos prêmios Oceanos e Kindle de literatura. Livros: A Menina Iluminada e A Buda. Filmes: Charlote SP, primeiro longa metragem brasileiro filmado com celular, dirigido por Frank Mora; e Deneli, curta metragem vencedor de prêmios internacionais dirigido por Dácio Pinheiro.

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