Se você acha que só porque virou o ano vai conseguir se desintoxicar daquela orgia consumista do Natal, está muitíssimo enganado. Sendo mãe ou pai de crianças em idade escolar, a resolução de Ano Novo de gastar menos vai ter que ficar para depois do Carnaval, porque janeiro é época de renovar o material escolar.
Todo ano, quando entro no site da escola para baixar a nova lista de material dos meus filhos me surpreendo com a quantidade de itens e com a abundância criativa do mercado papeleiro. Da próxima vez que precisar contratar um bom profissional de marketing, já sei onde procurar. São infindáveis tipos de canetas esferográficas, hidrográficas, lápis grafite, lápis de cor, eco lápis, tintas, pincéis, pastas, plásticos, blocos e papeis de diferentes gramaturas e dimensões. Isso sem falar nas colas! Outro dia sonhei que a escola faria um projeto – destes multidisciplinares construtivistas montessorianos waldorfianos – de colar as partes da placa tectônica que se rompeu no Sudeste Asiático com cola Pritt, tamanha a quantidade de tubos solicitada.
Sei que a maioria das mães compartilha comigo do ideal romântico de conseguir resolver todos os itens em um único lugar, com um único – e platônico – vendedor, mas isto quase nunca se faz possível.
Vendedor: “Senhora, infelizmente não temos a pasta vermelha para Matemática e o lápis chanfrado 2.7 mm. Temos apenas o 2.8 mm, mas ele não é chanfrado.”
Cliente ansiosa: “Acho que esta pasta laranja faz as vezes da vermelha e o lápis 2.8 mm vai dar conta, afinal, ele também escreve e este é o objetivo, não é?”
Vendedor: “Se a senhora não liga que sua filha seja a única com pasta de cor diferente, e se o lápis não for desconfortável para ela escrever, então acho que funciona sim.”
Depois de me sentir um pouco traída pelo vendedor quase perfeito e de tirar do carrinho os itens que denunciam minha culpa materna, avanço nos itens da lista e decido confiante que os apontadores com e sem depósito, a tesoura reta sem ponta, a régua de acrílico sem desenhos, o estojo e a lancheira ficarão de fora, pois serão minha oportunidade educativa de ensinar às crianças a importância de sermos conscientes com o meio ambiente e que não é preciso comprar todo ano tudo novo. Mas minha confiança – e minha pose de mãe ecologicamente correta – se esvai na mesma hora em que chego em casa e resolvo separar o material antigo. Percebo que o tsunami gerado pelo rompimento da placa tectônica que a escola está tentando restaurar com cola Pritt deve ter atingido o estojo do meu filho! Seria a única explicação plausível para que objetos se degradem tão rapidamente e uniformes novos fiquem tão encardidos em tão curto espaço de tempo. Se aquela filosofia popular (propagada por uma marca de sabão em pó) de que a sujeira é diretamente proporcional à alegria, posso ficar satisfeita em ver que meus filhos estão na escala máxima.
Depois de algumas papelarias diferentes e várias centenas de reais mais pobre, me dou conta de que vou ter saudade. Não necessariamente da pasta catálogo ofício A3 com 50 sacos plásticos de 3 furos, nem do papel canson 325 x 235 mm, 8 cores, 120g/m2 e nem da perspectiva de ter que etiquetar essa parafernália toda – item por item – para ambos os filhos. Mas vou ter saudades desses tempos de uniformes encardidos, canetinhas, giz de cera, lápis de cor, colagens, letras gordinhas e desenhos mágicos. Tempos de tê-los na barra da minha saia. Tempos tão doces, tão ternos e tempos que não voltam mais.
Por Shelly Zaclis Bronstein – Autoterapia