Há algum tempo, tive um chefe muito bom que ditava uma execução super acelerada para nossa área na empresa. As decisões eram assertivas, as aprovações eram rápidas, tudo acontecia. Lembro que uma das coisas que mais o deixava irritado eram as frases no gerúndio! Se ele perguntasse sobre algum projeto, e o coitado do interlocutor respondesse algo na linha de “estamos analisando” ou “estamos trabalhando para que isto aconteça”, ele ficava totalmente frustrado. Isto virou até meio icônico sobre ele. Para agradá-lo, evitava-se o gerúndio a qualquer custo, não apenas no vocabulário, mas principalmente na forma de conduzir-se no dia-a-dia. E funcionava! Sinto muita falta do ritmo que ele impunha para os negócios. Mas na vida, acho que este ritmo não funciona, pelo menos não para mim. Acho que o tal “gerúndio” (não o gerundismo, que é insuportável!) é o que dá toda a graça à coisa. Realizar metas e sonhos pode até ter sua importância, mas o sonhar e o processo contínuo que envolve alcançá-los é o que realmente faz valer a pena. Acho que Ferreira Gullar conseguiu exprimir isto muito bem quando disse que “nada do que foi feito satisfaz a vida, nada enche a vida. A vida é viver”. Acho tão linda e verdadeira esta constatação. Nesta época do ano, vemos muitos “life-coaches” falando sobre a importância da disciplina para materializar resoluções de ano novo, para não se frustrar ao chegar a esta época com objetivos não alcançados. Há tempos que já não faço mais as tais resoluções, pelo menos não de forma tão estruturada. Mas mesmo se as tivesse, acho que conviveria tranquilamente com elas se renovando (ou não) para o ano seguinte. Algumas deixando de ter importância, outras novas chegando. Convivo bem com sonhos habitando e deixando de habitar meu córtex, sem tanto compromisso ou prazo específico de validade. E passei a gostar cada vez mais da estrada, com seus pequenos percalços e derrapadas, com suas bifurcações, subidas e descidas. Adoro um desvio de rota para poder me surpreender também. Sigo vivendo, sonhando, construindo, buscando, sempre em movimento, sempre no gerúndio. Confesso que não sei muito bem onde (ou se) quero chegar, mas sei que ando encontrando muitas flores e alegrias ao longo do caminho.
Shelly Bronstein – Autoterapia