SEJA NINGUÉM

SEJA NINGUÉM
Ser alguém é um fardo.
Ao ser Juliana, ao ser Rodrigo, você acredita que existe, mas é apenas uma convenção.
Quando você é alguém, esse alguém sofre. Ao ser criticado, Rodrigo sofre. Ao ser criticada, Juliana sofre.
Não seja ninguém, não seja nada. Se você não é alguém, ao ser elogiado, você não é o elogio. Ao ser criticado, você não é a crítica. Você vê “isso” acontecendo, mas como não é alguém, não se envolve, não se torna nada.
Assim, seja o que for que disserem de você, não se transforma em você. Se você não é ninguém, não tem nenhuma imagem que precise ser sustentada, nem defendida. Não tem nenhuma imagem (construída por você ou pelo olhar os outros) com que se orgulhar.
Não tem alguém para ser incrível, nem para ser miserável.
Tanto Juliana, como Rodrigo, Fernando, Vanessa, Patrícia, seja qual for a identidade construída que leva esse ou aquele nome, ao entenderem que não possuem substância real, que são meras convenções, começam a demolir o castelo de conceitos que se auto-construíram. Começa a ruir o conceito chamado Rodrigo. Rodrigo então compreende que foi ele mesmo e as outras pessoas que criaram essa identidade, mas que ela é só uma criação conceitual.
Se não tem mais Rodrigo, nem Juliana, não há mais ninguém. Só “alguém” que precisa de proteção e consideração. Só alguém que se magoa, que precisa se defender, que precisa lutar, que precisa convencer o outro do valor que tem.
Sendo ninguém, nada disso acontece. O sofrimento de sustentar o peso da identidade cessa.
Sendo ninguém, você não é dono de nada também. Você não pode possuir nada nem ninguém. Você se relaciona com tudo entendendo que nada é seu. Quando tomamos algo por nosso, imediatamente nos agarramos a isso. Começamos então a lutar por manter aquilo que conquistamos e se eventualmente o perdemos, sofremos muito.
Deixando de ser alguém, deixamos de acumular. Deixamos de precisar manter, aumentar e sustentar. Apreciamos as coisas e as pessoas sabendo que não somos donos delas. Deixamos que elas sejam o que são e nos encantamos com a beleza do momento presente.
Lidando com o momento presente, estamos preparados com o que quer que aconteça.
Não tendo um “eu” para arbitrar, tudo acontece naturalmente. Não precisamos temer as transformações naturais.
Deneli Rodriguez.
05.09.2017.


Deneli Rodriguez

Pensadora, escritora e artista. Menção honrosa Itaú Cultural com seu texto "A Menina Iluminada". Concorrente aos prêmios Oceanos e Kindle de literatura. Livros: A Menina Iluminada e A Buda. Filmes: Charlote SP, primeiro longa metragem brasileiro filmado com celular, dirigido por Frank Mora; e Deneli, curta metragem vencedor de prêmios internacionais dirigido por Dácio Pinheiro.

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