GRANDES QUESTÕES E ARTE DE NÃO RESOLVÊ-LAS

Alguém se diz magoado e pronto: passamos a querer entender porque aquela pessoa está magoada, nos questionamos, fazemos todo um filme na nossa mente desde o dia que a conhecemos, buscamos histórias em que aquela pessoa também nos magoou, passamos longas horas pensando sobre aquilo.
Transformamos um fato em uma grande questão.
A pessoa está magoada. É ela quem está sentindo a mágoa, logo é ela quem tem que resolver. Como é que outro alguém pode resolver a mágoa da pessoa magoada?
Provavelmente se essa pessoa magoada buscar entender o porquê de estar magoada vai encontrar como resposta: porque criei expectativas com relação a alguém, porque a pessoa não foi como eu gostaria e porque as coisas não aconteceram como eu gostaria.
Então essa questão de alguém se dizer magoado conosco, não tem nada a ver conosco. Logo, não precisamos resolver nada, nem transformar uma questão que nem é nossa numa grande questão mental.
Quando é que alguém consegue nos convencer que somos responsáveis pelos estados mentais e emocionais dele se soubermos que não somos? Por que é então que perdemos tanto tempo pensando sobre os estados emocionais dos outros?
Ficamos nos culpando, queremos convencer o outro de que o que ele está dizendo sobre nós está errado, mas não conseguimos resolver a mágoa que o outro está sentindo.
Não vamos conseguir mesmo. O outro já se convenceu que os outros são os responsáveis pelos seus estados emocionais. Esse outro não sabe que o responsável por todas as suas emoções é ele próprio. Não sabe ou não quer saber.
Imagina a mente dessa pessoa que passa a vida culpando aos outros pelas suas emoções? Essa pessoa deu a condução da sua vida para os outros. Jamais assume a responsabilidade óbvia de que é a grande responsável pelo seu próprio sofrimento. Jamais consegue resolver suas questões porque sempre precisa do outro para culpar.
Entendamos de uma vez por todas que as questões emocionais dos outros são deles. Façamos o movimento de perceber quando isso acontece e não tentemos resolver o que não é nosso.
É uma arte não resolver.
Aprendemos que tudo precisa de correção, de conserto; que tem que ser diferente do que é; que ninguém pode ter uma opinião a nosso respeito que não gostemos; que não seja verdade. Queremos sempre esclarecer o que não tem como ser esclarecido. O que o outro acha de nós é a opinião dele, baseada em projeções e expectativas dele. Imagens e projeções que ele fez e faz a nosso respeito e que confirmamos ou não confirmamos de alguma forma.
Muita gente vai se decepcionar com você ao longo da vida. Não porque você tenha feito algo, mas simplesmente porque você não atendeu às suas expectativas.
Deixemos de criar grandes questões a respeito do que o outro pensa ou diz sobre nós; deixemos de pensar como resolver os assuntos interiores dos outros e saibamos perceber quando isso acontece.
Sofremos porque querermos provar aos outros quem somos; provar que suas opiniões a nosso respeito estão erradas.
Podemos deixar de cobrar isso também dos outros? Podemos parar de culpar as pessoas por nossos estados emocionais? Podemos deixar de cobrá-los por não atenderem nossas expectativas?
Podemos deixar de criar grandes questões a respeito dos outros?
Podemos deixar de resolver o que não é nosso?
Assumindo a responsabilidade por nossa vida, deixamos de viver com mágoa. Temos escolha. Sermos responsáveis por nossos estados emocionais traz o alívio que tanto buscamos. Deixamos de inventar teorias a respeito dos outros e lidamos com a realidade.
Podemos viver assim?
Deneli Rodriguez.
21.04.2020.


Deneli Rodriguez

Pensadora, escritora e artista. Menção honrosa Itaú Cultural com seu texto "A Menina Iluminada". Concorrente aos prêmios Oceanos e Kindle de literatura. Livros: A Menina Iluminada e A Buda. Filmes: Charlote SP, primeiro longa metragem brasileiro filmado com celular, dirigido por Frank Mora; e Deneli, curta metragem vencedor de prêmios internacionais dirigido por Dácio Pinheiro.

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