Quando viajo, é muito raro escolher filmes novos para assistir no avião. Quase sempre, acabo assistindo a algum filme pela segunda (ou pela centésima) vez. Gosto de aproveitar para rememorar alguns dos meus chick flicks favoritos: Notting Hill, You’ve got Mail, Crazy Stupid Love…Em alguns deles consigo recitar algumas das falas de cor. Quero o descompromisso de poder dar uns cochilos (quem sabe dou sorte e acordo já aterrissando no meu destino) e deixar o cérebro meio desligado. Na minha última viagem, resolvi assistir novamente “Comer, Rezar, Amar” de Ryan Murphy, estrelando Julia Roberts. Na verdade, nem sei o porquê da opção, dentre tantas outras, pois lembro que na época do lançamento não entendi a razão do seu tremendo sucesso. Achei o filme um bom passatempo, mas sem absolutamente nada que me marcasse. Talvez a película não tivesse traduzido bem a carga emocional e espiritual do livro de Elizabeth Gilbert, que dizem ser ótimo (como não li, não posso afirmar).
Mas desta vez, a sensação foi diferente. Adorei observar o contraste entre o prazer hedonista vivido pela personagem em sua temporada em Roma (a gastronomia, os vinhos, as celebrações) com a vida absolutamente frugal de seus meses na Índia, regados de muito silêncio, meditação e trabalhos comunitários na cozinha e na faxina do ashram. E na parte final do filme, achei lindo observá-la encontrando um equilíbrio inspirador entre espiritualidade e prazeres do corpo em sua temporada em Bali. É ali que ela conhece o brasileiro Felipe (bem que o Javier Bardem poderia ser mesmo nosso), se apaixona por ele, mas resiste a se entregar ao sentimento. Quando conta ao seu guru, Ketut, que colocou um ponto final no relacionamento porque com ele não conseguia manter seu equilíbrio, o sábio curandeiro indonésio diz a ela que às vezes, perder o equilíbrio por um amor faz parte de uma vida equilibrada.
Nesta hora, pulei na cadeira e não foi por causa da forte turbulência. Achei aquela frase simplesmente genial: perder o equilíbrio, às vezes, faz parte de uma vida equilibrada. Buscamos obcecadamente o meio-termo, supervalorizamos a serenidade, desconsiderando que muitas vezes é exatamente o desequilíbrio que irá nos levar a encontrar novos caminhos, e com eles, uma nova harmonia. Como no símbolo de Yin e Yang, onde há um balanço perfeito entre duas energias opostas (as gotas preta e branca que se entrelaçam). Dentro de cada gota, há um pontinho da cor oposta, lembrando que quando uma força atinge o seu extremo, manifesta em si a semente do seu oposto. Às vezes, precisamos dos extremos para encontrar um equilíbrio maior. Entre filosofia chinesa, altitude, vinho, turbulência e uma vontade descontrolada de ir para Bali, aquela mensagem me tocou profundamente e me mostrou que nem sempre a primeira impressão é a que fica.
Por Shelly Zaclis Bronstein – Autoterapia