Bom seria se a vida acontecesse ao contrário, como disse, certa vez, com muita propriedade, o glorioso Charlie Chaplin. Segundo Chaplin, melhor seria o viver se nascêssemos idosos e fôssemos, aos poucos, remoçando. Passaríamos, primeiramente, pela velhice e todo tipo de infortúnio que nos chegam com o passar dos anos. E, logo, ficaríamos livres do sofrimento pois, a juventude nos chegaria dia a dia, levando embora as rugas, as doenças e tantos outros males que nos acometem nessa fase da vida. Nossos últimos nove meses de vida seriam vividos confortavelmente aconchegados no útero materno para depois, finalmente, morrermos num grande e explosivo orgasmo. É, sem dúvida, seria uma morte bastante prazerosa…
Mas o mundo ainda não enlouqueceu a tal ponto. Relógios não andam para trás, (com exceção no horário de verão) idades não retrocedem, os movimentos de rotação e translação da Terra continuam seu ritmo normal e não, não morremos num delicioso orgasmo…Pode até ser que um sortudo ou outro, consiga essa proeza mas, não é regra geral. Já começamos a envelhecer no momento do nascimento. Cada dia que passa, menos um dia na vida.
A boa notícia é que estamos vivendo mais. É fato. Com o avanço da ciência e da medicina, e as descobertas de novos medicamentos, nossa expectativa de vida tem aumentado gradativamente. Estamos envelhecendo. E, também, nossos pais e nossos avós. A maternidade vem sendo postergada cada vez mais e hoje em dia, não é difícil encontrarmos, vivendo em uma mesma casa, três gerações ao mesmo tempo. Mas nem sempre essa convivência se dá de forma pacífica. Nossos pais estão envelhecendo e, nós também.
Será que estamos preparados para cuidar de nossos pais com todo o amor e carinho que merecem?
É, sem dúvida, uma situação delicada. De repente, nos vemos tendo que cuidar dos pais, dos filhos, dos avós e de nós mesmos, na correria dos dias de hoje. Será preciso, principalmente, um preparo psicológico para aceitarmos que nossos pais, a quem costumávamos ver como heróis, encontram-se fragilizados física e psicologicamente. Aqueles heróis que nos defendiam com unhas e dentes dos perigos, hoje, são indefesos e dependentes. Será preciso conciliar uma série de cuidados por parte dos parentes, caso o idoso passe a viver sob os cuidados da família. Os idosos costumam apresentar comportamentos difíceis. Alguns ficam esquecidos, outros apresentam dificuldades de locomoção, teimosia, outros partem para a agressividade, não conseguem sequer ir ao banheiro sozinhos, esquecem dos remédios e da própria higiene. Há também, os idosos fisicamente capazes. Esses, sofrem de um outro mal, o mal da solidão. É do que mais se queixam. E, não é só. É preciso também, adaptar a casa às necessidades do idoso. Todo cuidado será pouco.
Alguns, decidem por asilos. Essa decisão pode partir da família ou do próprio idoso. Mas para isso, será preciso dispor de uma considerável quantia mensal. Quanto melhor o lugar, mais caro ele será. Existe também a situação em que apenas um elemento da família fica responsável por todos os cuidados ao idoso, o que também, não seria justo.
Como podem ver, a situação é de extrema delicadeza. Infelizmente, em nosso país, os cuidados oferecidos aos nossos idosos estão a anos-luz da aceitabilidade. Pode ser que em países como Austrália ou Canadá, o idoso seja visto e tratado como de fato merece. Pois o idoso precisa de tratamentos adequados, cuidados específicos, cuidadores preparados e sobretudo, precisam de respeito, muito amor, dedicação e carinho.
Faz pouco tempo, passei pela experiência de cuidar, em minha casa, do meu pai, que precisou passar por uma prótese de joelho. Ele, felizmente, goza de boa saúde aos oitenta e três anos, apesar de apresentar um esquecimento bastante significativo. Confesso que foram quatro meses difíceis, entre consultas, exames, medicamentos, noites mal dormidas e um grande susto, quando precisou de uma UTI após a cirurgia. Muitas vezes, ouvi histórias repetidas três a quatro vezes por dia, fingindo ser a primeira.
Mas quando eu via aquele senhor, com dificuldade de locomoção, as costas curvadas…quando eu o via, com vassoura e balde nas mãos tentando lavar o chão, fazendo questão de me ajudar nos serviços domésticos, uma sensação de pequenez me invadia e eu pensava que jamais, por mais que eu faça nesse tempo que ainda lhe resta de vida, jamais, eu conseguiria agradecê-lo por toda uma vida de luta, dedicada aos filhos e a família. Sim, eu sei, hoje não é dia dos pais, hoje é um dia comum, em que me lembrei dele com saudade…e dia da saudade não existe. Existe?
Elenice Bastos.
IMAGEM: Google.