O medo do amor e a necessidade de ser o mais brilhante do par

coisas que afastam o casal

 

O tema amor é o que mais leva pessoas a consultar psicólogos, psicanalistas e psiquiatras. Foi o que disse um profissional da área. Acredito que sim. Pois nada devassa ,nos preenche e nos esvazia tanto quanto o amor. Nada penetra tão profundamente a nossa intimidade.

Como disse o personagem protagonista do filme “Verão de 42” , nada nem ninguém durante toda a vida dele o fez se sentir tão orgulhoso e tão humilhado quanto a mulher que ele amou na adolescência.

Encontrar a pessoa que vai se conectar intensamente e verdadeiramente conosco , talvez, seja uma das missões mais complexas da vida. Não basta se conhecer. Não basta saber escolher. É preciso também uma boa dose de sorte, como diria Rita Lee na música “Amor e sexo”. Ou ainda, podemos concordar com Cazuza quando ele disse que o amor era uma coincidência.

Porém, por mais que a maioria das pessoas sonhe desesperadamente com este grande encontro afetivo, o que mais vemos são casais forjados pela solidão e pela necessidade de autoafirmação. O que vemos é gente se juntando por medo, por desespero de ficar só. Por necessidade de ter uma companhia para dividir uma pizza no sábado à noite e pegar um cinema no domingo à tarde. Ter alguém ao nosso lado não significa estar acompanhado e provavelmente a solidão a dois é a mais dolorosa, pelo menos para aqueles que são mais honestos consigo mesmo.

Porém, por mais que as pessoas queiram conscientemente encontrar o amor, por outro, elas o temem. Pois o amor abala estruturas, desorganiza a rotina, balança as nossas certezas.

Muitas vezes as nossas escolhas afetivas não são realmente afetivas. Muitas vezes precisamos ficar com quem depende de nós. Com quem nos enxerga como um rei, como um sabe tudo, como um fodão ou fodona para escamotearmos as nossas próprias fragilidades. Em suma: quantas vezes não imaginamos nos apaixonar por uma pessoa ou até mesmo decidimos racionalmente ficar com alguém intelectualmente inferior à nós e/ou pouco atraente para evitar o risco da perda , da rejeição? Quantas vezes não escolhemos pessoas com personalidades menos marcantes para sermos nós a parte forte do casal?

Quantas pessoas não fogem de relações potencialmente intensas com parceiros inteligentes, cultos , de personalidade forte e sexy para embarcarem em relações mornas com pessoas opacas e inexpressivas?

Envolver-se com alguém que brilha nos faz perder o controle da situação. É correr o risco de ser a parte opaca. Porém, numa relação saudável e verdadeiramente amorosa existe espaço para as duas partes se desenvolverem e brilharem pois como disse Einstein, quando temos o amor , podemos conquistar o mundo por meio dele.

Não digo que a escolha por relações mornas e parceiros opacos seja sempre um processo consciente. Para falar a verdade , acredito que em muitos casos , a gente não entende direito porque está com uma pessoa mesmo quando a gente acha que sabe.

Só sei que muitas vezes o que une um casal não são as suas afinidades ou tudo de bom que viveram juntos. Muitas vezes um vício ou defeito em comum une mais do que um monte de qualidades positivas. Mas provavelmente nada une mais do que o medo.  Por tal razão, quem vive com medo , não consegue viver o amor.  Para viver o amor é preciso ter coragem pois ter coragem é viver com o coração.  Dizem que o coração é tolo. Pelo menos é o que a nossa sociedade medrosa diz.


Sílvia Marques

Viciada em café, chocolate, vinho barato, filmes bizarros e pessoas profundas. Escritora compulsiva, atriz por vício, professora com alma de estudante. O mundo é o meu palco e minha sala de aula , meu laboratório maluco. Degusto novos conhecimentos e degluto vinhos que me deixam insuportavelmente lúcida. Apaixonada por artes em geral, filosofia , psicanálise e tudo que faz a pele da alma se rasgar. Doutora em Comunicação e Semiótica e autora de 7 livros. Entre eles estão "Como fazer uma tese?" ( Editora Avercamp) , "O cinema da paixão: Cultura espanhola nas telas" e "Sociologia da Educação" ( Editora LTC) indicado ao prêmio Jabuti 2013. Sou alguém que realmente odeia móveis fixos.

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