Fósseis de anfíbios de 280 milhões de anos são descobertos no Piauí

Há 280 milhões de anos o Piauí e o Texas eram bem próximos, separados apenas por uma cordilheira. A condição de vizinhos, torna natural que a fauna de ambos fosse bem parecida; os dois estavam no megacontinente de Gondwana. Porém de lá pra cá muita coisa aconteceu: os dinossauros surgiram, foram extintos, o ser humano surgiu, resolveu estudar e até hoje preenche lacunas históricas. Uma dessas lacunas é a descoberta de três espécies de anfíbios que viviam em um lago cristalino no lado piauiense da cordilheira.

A Revista Galileu, conversou com o professor da UFPI que liderou a expedição.

“Em todo o hemisfério sul não se conhecia nenhuma fauna terrestre dessa idade” diz o professor Juan Cisneros, um dos responsáveis pela descoberta.

Vamos às apresentações formais: Timonya annae era um animal de corpo alongado, coluna vertebral bastante flexível e membros curtos. Essas características indicam que ele se locomovia com movimentos sinuosos, semelhante ao de uma serpente, e que raramente deixava o lago para se aventurar na terra firme, já que seus membros não suportariam seu peso fora d´água. Ele era o menor dos três – 20 a 40 cm de comprimento – e também o que se sabe mais a respeito: 20 fósseis foram encontrados no local. Seu nome foi escolhido em homenagem ao local em que foi descoberto, a cidade maranhense de Timon.

O outro é o Procuhy nazarienis, um parente próximo do Timonya, com o dobro do seu tamanho. Desse, somente um crânio e uma mandíbula foram localizados por enquanto. O Procuhy tem nazariensis como sobrenome também por causa da cidade que ocupa essa região do antigo lago: Nazarena, no Piauí. É provável que as duas espécies sejam primas distantes das salamandras.

E por fim, o terceiro fóssil que é o menos completo, tanto que só terá um nome científico quando mais informações forem coletadas. O que dá pra dizer por ora é que ele tinha um metro e meio de comprimento e provavelmente se alimentava dos outros dois anfíbios recém-descobertos. Essa espécie foi encontrada na cidade piauiense de Monsenhor Gil.

Onde costumava ser um lago imenso – ou vários lagos menores – hoje é uma pedreira que extrai blocos para a construção civil. O que pode soar como um conflito de interesses, no final das contas pode ser um auxílio. “Eles estão cavando pra nós”, explica Juan. Segundo o professor da Universidade Federal do Piauí, essa convivência “poderia ser melhor, mais orientada”, mas ainda assim pode render bons frutos. “Se não fosse pela escavação deles, a gente jamais teria achado o que achou”.

Embora os três anfíbios terem vivido em um lago, eles são considerados parte da fauna terrestre porque não viviam em um oceano – o nome técnico para esse grupo é fauna continental, explica Juan, que considera que são três os principais pontos da descoberta: estamos falando dos primeiros fósseis de fauna continental no hemisfério sul do período permiano; estamos falando de mais uma confirmação de que os animais que habitavam o atual sul dos EUA guardam muitas semelhanças com os animais que viviam onde hoje é a região do Piauí e, por fim, estamos falando da comprovação de uma hipótese até então improvável: no início do período permiano a vida já prosperava, sim, em terras sul-americanas, pelo menos no norte e nordeste do Brasil.

Havia dúvidas em relação a isso porque durante o carbonífero, período imediatamente anterior ao permiano, o planeta era mais gelado. Isso aliado ao fato de que o continente todo estava mais próximo do polo sul, em uma época em que “Teresina estava na mesma latitude do Rio de Janeiro”, fazia com que se levantasse suspeitas sobre a possibilidade dessa região ter uma fauna vibrante.

A equipe que integrou a expedição é constituída por sete pessoas, mas foi o próprio Juan quem bateu os olhos pela primeira vez em um fóssil de Timonya annae. No entanto achar o fóssil é só um começo para uma longa empreitada: só depois de um ano de pesquisas estava claro para o grupo que o que eles tinham em mãos desde 2011 era uma descoberta científica e o estudo que reúne todos os detalhes da descoberta só foi publicado em 2015.

Agora o desafio é entender como essa cordilheira entre o Texas e o Piauí era trespassada pelos animais – Juan diz que outro desafio é relacionado à pedreira que funciona no local: segundo o professor, é bem possível que o tema do mestrado de uma de suas alunas seja baseado em um futuro trabalho de educação patrimonial a ser realizado junto a estudantes e funcionários da pedreira, que aprenderiam como identificar possíveis fósseis.

Via Revista Galileu


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