A ditadura do pensamento positivo

Sou uma pessoa que gosta muito de ler. Deleito-me com obras literárias de diversas nacionalidades; entro em estado de êxtase ao me deparar com os diálogos de Platão, ou os escritos de seu discípulo mais conhecido: Aristóteles. Não à toa que me graduei em Filosofia! Pude, tornando-me um amante da sabedoria (filósofo), bem antes de entrar para a academia, buscar diferentes formas de conhecimento que a humanidade acumulou ao longo de sua existência.

Foi numa dessas buscas que me vi em contato com as ciências da natureza, de uma maneira mais árdua. Influenciado pela indústria cultural e por meu pai, apaixonei-me por dinossauros, o que me levou, por sua vez, a interessar-me por geologia e paleontologia.

Consequentemente, descobri um paleontólogo que me chamou a atenção: Stephen Jay Gould. E não foi só pela suas ideias sobre evolução biológica. Em uma de suas obras, intitulada “Lance de Dados”, ele narra uma experiência pessoal e, ao mesmo tempo, demonstra receio (?), ao compartilhá-la, de que possa servir como argumento para aqueles que pertencem ao que ele chamou de “movimento da ‘atitude positiva'”.

Essa experiência, a qual ele descreveu, está relacionada a uma fase bem difícil e delicada que passou. Foi diagnosticado com um câncer extremamente agressivo e que, na época, não lhe daria muitas chances de viver por muito tempo. Entretanto, devido à sua característica otimista e de disposição para enfrentar desafios, ele conseguiu superar a doença.

Pois bem, em que isso é ruim? Muitos podem achar estranho, e fazem o questionamento do porquê temer que uma história de superação possa ser prejudicial. Para entender melhor, transcrevo o que Gould diz:

“… devemos nos opor resolutamente à crueldade não intencional do movimento da ‘atitude positiva’ – uma escorregadela insidiosa numa retórica de culpa para aqueles que não conseguem superar o desespero pessoal e apelam para a positividade de sua profundeza interna. (…) não há um dedo para pôr em funcionamento imediato a positividade com um único e indolor movimento de pressão.”

De fato, se nós, em vez de ficarmos exigindo que alguém supere seus problemas, apresentando maneiras e listas de como agir desta ou daquela maneira, tratá-lo com empatia, ou seja, tentar colocar-se no lugar dela, inclusive compreendendo sua história de vida, será um ato de amor e respeito muito grande por ele/ela.

No caso em questão, uma doença, colocado por Gould, evoco sua palavras novamente, e que deve servir para outra situações:

“… Se um homem morre de câncer no medo e desespero, então choremos por sua dor e celebremos sua vida. O outro homem, que lutou desesperadamente e riu no final, mas também morreu, talvez tenha tido uma vida mais fácil em seus meses finais, mas não partiu com mais humanidade.”

Esse grande cientista, nos dá uma lição grandiosa de como ser solidário, sem cairmos na armadilha de dar conselhos, às vezes até agressivo, para que o outro seja forte. Como eu mencionei acima. existe uma história de vida, que deve ser levada em conta. E toda história de vida é única, com experiências próprias de cada um. Até costumo dizer que “a sua experiência não é a minha experiência”.

Não há mal nenhum, quero deixar bem claro, em apresentar listas de como devemos ser ou não, desde que sejam apresentadas como sugestões, e não como uma espécie de manual de vida a ser seguido à risca. O importante é não deixarmos levar pela tentação em achar que fulano é fraco porque não agiu como beltrano. A humanidade faz parte de todos nós.

 

 

 

 


Carlos Martins

Professor da rede estadual de ensino, graduado em Filosofia-UFG, pós-graduado em Educação e Cinema-IFITEG, apaixonadíssimo pelo conhecimento.

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